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ARTIGOS

Autor: Pedro Carrano
28/08/2015

Banco de horas significa tempo de trabalho não pago?

Banco de horas significa tempo de trabalho não pago?

A flexibilização da jornada de trabalho foi uma das medidas integrantes da chamada reestruturação produtiva, que dificultou a organização nos locais de trabalho desde os anos 90.


Entre os acordos para a flexibilização da legislação trabalhista está o banco de horas, regulamentado em 1998, pelo governo FHC. Na avaliação de autores da sociologia do trabalho, o banco de horas, de maneira geral, tem contribuído para a extensão da jornada, embora na aparência se revele uma forma de otimizar o tempo de produção e, também, de descanso.


O mecanismo, por um lado, tem um grande atrativo para o profissional, na chance de ampliar as férias por um período maior ou emendar, por exemplo, um feriado. No entanto, é uma maneira também de burlar o necessário pagamento de horas-extras quando o trabalhador ultrapassa a sua jornada regular de trabalho.


O problema acontece quando o profissional passa a aceitar o sobretrabalho e a jornada excessiva, compensada mais tarde via banco de horas, com as consequências geradas à sua saúde e vida familiar. Neste sentido, ele sequer recebe a contrapartida financeira para esse tempo excedente dedicado à empresa.


Banco de horas e produtividade


Em seu relato sobre a experiência dos metalúrgicos de São Paulo, Tropia (2009) narra como nos anos 1990 os trabalhadores foram favoráveis à aplicação do banco de horas.


No caso de um ramo como o dos metalúrgicos, entretanto, é fato que o banco de horas pode compensar os períodos de baixa de produção, quando ocorre, por exemplo, a falta de algum componente das empresas fornecedoras. Com isso, o banco se encaixa na demanda de produção.


Na produção de mercadorias, está dentro do objetivo das empresas enxugar ao máximo os tempos “ociosos” ou mortos da produção em nome da produtividade. O trabalhador então oscila entre períodos de alta intensidade de trabalho, podendo descansar então quando a empresa ajusta e diminui a sua produção. O que também é complicado, devido às doenças do trabalho causadas pelo ritmo intenso.


Banco de horas e a atividade jornalística


A situação do banco de horas para o jornalista guarda diferenças e questões específicas. Quanto à produtividade, o banco de horas em tese não faz sentido na medida em que o jornalista trabalha na maioria das vezes com prazos de fechamento dos trabalhos – embora é fato que a a internet pauta hoje uma produção sem definição prévia.


Em empresas de comunicação, como é o caso do monopólio da RPC, o banco de horas, em defasagem desde 2011, mas aplicado hoje na prática, está atrelado ao acordo de extensão da jornada de trabalho de cinco para sete horas diárias. A partir da sétima hora a empresa é obrigada a pagar a hora-extra em 100% do valor da hora de trabalho.


Com isso, o jornalista não precisa ter o turno em todos os finais de semana, mas no rodízio de apenas um final de semana por mês. Há o entendimento de que a jornada de trabalho do jornal é de 25 horas, porém 30 horas no caso de empresas que operam nos finais de semana.


Entretanto, com a extensão, a jornada de trabalho dilata-se, no geral, para 35 horas semanais, podendo haver compensação via banco de horas.


A direção do Sindijor tem se posicionado contrária ao banco de horas sempre que o tema aparece, mas respeitando as assembleias da categoria, que são soberanas, e em muitos casos tendem a aprovar a medida.


Porém, a análise do acordo assinado em 2011 demonstra que, ao menos, havia algumas garantias barganhadas pelos trabalhadores, que devem sempre ser observadas: o prazo para a compensação de banco de horas, podendo as horas-extras serem pagas também em caso de rescisão contratual.


Já o contrato assinado no dia 25/02/2010 com a Editora Gazeta do Povo coloca 60 horas como o máximo para compensação, sob a pena de as empresas pagarem 100% de hora extra. O problema é que empresas do mesmo grupo, como a Tribuna do Paraná, chegam a ter trabalhadores com mais de 100 horas de trabalho geradas e sem o devido pagamento.


Outro problema grave é a falta de controle sobre a jornada de trabalho dos editores, que hoje ultrapassa as oito horas diárias.


Constam, entretanto, uma série de itens neste acordo, tais como o envio de relatórios periódicos ao sindicato para monitorar esta situação, ou mesmo a formação de uma comissão dos trabalhadores para seguir o caso. Os trabalhadores também devem ser avisados com antecedência sobre a realização de plantões, para que isso permita uma organização pessoal. São itens que os jornalistas devem cobrar para fazer valer.


Ou seja, é fundamental que os jornalistas exijam a possibilidade deste acompanhamento e controle sobre um mecanismo que, se permitirmos, tende a multiplicar as horas trabalhadas e não compensadas.

Articulista: Pedro Carrano
Jornalista no Sindicato dos Servidores Públicos Municipais Curitiba (Sismuc) e diretor-executivo do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Paraná.
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