ARTIGOS
Neste Dia Internacional da Mulher, lançamos um desafio: abrir o jornal, acessar grandes portais de notícia ou buscar nas emissoras de televisão ou de rádio reportagens sobre o 8 de Março que tragam algum nível de problematização, e não apenas reforcem estereótipos de gênero.
A ausência quase completa de um enfoque mais propositivo e contextualizado é a
prova de que, mesmo com a evolução que vem acontecendo nos últimos anos, a
imprensa ainda tem muito a melhorar quando a questão é a promoção da igualdade
de direitos e oportunidades entre mulheres e homens.
Todos os dias, matérias nas editorias policiais falam sobre casos de agressões
e violência, ou até mesmo de assassinatos em que a mulher é a vítima. No
entanto, com que frequência estas mesmas notícias trazem o termo feminicídio -
nomenclatura correta para a modalidade de homicídio em que a mulher é morta
unicamente por ser mulher?
Somente em 2015, o Paraná registrou 75 mil crimes contra a mulher (bit.ly/1U0yrEf) - a cada hora do ano passado,
segundo o relatório da Secretaria de Estado da Segurança Pública (Sesp),
divulgado pelo Livre.jor, oito mulheres sofreram algum tipo de violência. Se
levarmos em consideração que os dados são baseados nos casos denunciados e que
uma parte significativa dos crimes sequer chega às autoridades, veremos que o
número é ainda maior.
Na maioria das vezes, a agressão é cometida pelo parceiro, companheiro ou
marido. Talvez por isso, expressões como “vingança” ou “crime passional” sejam
tão recorrentes, o que estimula a naturalização e a romantização deste tipo de
situação. Há, ainda, uma infinidade de reportagens que “justificam” o crime à
luz das atitudes da mulher, culpabilizando-a e reforçando preconceitos já tão
arraigados na sociedade patriarcal - de que a mulher é a única responsável pela
própria segurança, que precisa “se dar o respeito” ou “se cuidar”.
A culpa não é da mulher; é do machismo
O que a imprensa noticia reflete uma sociedade fundamentada quase que
exclusivamente na valorização do masculino. Não é à toa que as mesmas
propagandas e comerciais de televisão que nos mostram como “donas de casa”,
como “o sexo frágil” e como as únicas responsáveis pela criação dos filhos
também nos retratam como um objeto sexual, que deve estar disponível e ao
alcance do homem.
A formação destes estereótipos, contudo, vai além dos comerciais de cerveja e
de produtos de limpeza. Reflete-se também na maneira como a mulher é
apresentada nos materiais jornalísticos e informativos.
Matérias nos cadernos de esportes, por exemplo, focam nos aspectos estéticos e
esquecem das conquistas. Conteúdos das editorias de Moda e Beleza estabelecem
“padrões” inalcançáveis e que se distanciam completamente da realidade da
mulher, reforçando opressões como a gordofobia, a transfobia, a lesbofobia, o
capacitismo e o racismo.
É papel do jornalismo ser responsável e consciente na forma como representa as
mulheres. Esse não é, porém, nem de longe o único problema da cobertura
midiática sob o ponto de vista do feminismo. É na ausência da mulher como fonte
e como protagonista de suas próprias histórias que também se fundamenta a
cultura do machismo. Quase não aparecemos em questões relacionadas a pesquisas
científicas e participação política, nem em posição de autoridade ou de maior
responsabilidade. Ainda que entrevistadas para reportagens sobre cargos
políticos ou grandes conquistas, somos constantemente questionadas sobre
filhos, famílias e dicas para manter a forma.
A não valorização dos aspectos que de fato deveriam importar para as matérias
se coloca no caminho da luta feminista pela igualdade de gênero, à medida em
que ajuda a propagar uma imagem da mulher que vem sendo construída há mais
tempo do que podemos contabilizar.
Aos meios de comunicação, cabe desconstruir visões tão distorcidas. É preciso
entrevistar mulheres sobre os mais diversos temas, e não apenas sobre os
assuntos considerados femininos. É preciso entrevistar especialistas em gênero.
É mais do que necessário problematizar a violência contra a mulher e investigar
suas causas, para levar a discussão até um número cada vez maior de pessoas.
Já existem iniciativas que contribuem com os jornalistas nesse sentido e que
podem ser usadas como ferramentas para promover o debate. Propomos aqui (http://bit.ly/21XraGH) alguns direcionamentos
para quem deseja pensar em um jornalismo compromissado com as questões de
gênero.
Entidades feministas de diversas ordens, blogs e sites, além de organizações
como o Instituto Patrícia Galvão também trazem dados que auxiliam na fundamentação
das críticas. Tais recursos podem e devem contribuir para que, neste Dia
Internacional da Mulher, não tenhamos mais notícias sobre cuidados com a pele
ou o cabelo, mas sim acerca da problematização e do respeito que precisamos e
que merecemos. (Ilustração: Sabrina Gevaerd)
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