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13/10/2025

Jornalismo em tempos de guerra narrativa: o que está em jogo quando a verdade vira disputa?

Jornalismo em tempos de guerra narrativa: o que está em jogo quando a verdade vira disputa?

No penúltimo dia do 8º Congresso Paranaense de Jornalistas, uma certeza emergiu da mesa “Jornalismo, acesso à informação e disputas de narrativas”: fazer jornalismo hoje é mais do que apurar e publicar, é resistir em meio a algoritmos, ataques e versões que competem pela verdade.


Na conversa, que reuniu Vinícius Cidral (OAB-PR), Paula Zarth e Cristiane Zacarias (Sindicato dos Bancários de Curitiba e Região), Agatha Branco (Sindicato dos Engenheiros do Estado do Paraná) e Sandro Silva (DIEESE), o debate escancarou os desafios contemporâneos da comunicação pública e sindical em tempos de polarização e descrédito.


Com dados, histórias e provocações, a mesa mostrou que transparência e narrativa são hoje territórios de disputa política, simbólica e institucional e que jornalistas, sindicatos e entidades sociais estão no olho do furacão.


Quando o silêncio institucional fala mais do que mil palavras


Abrindo o painel, o advogado Vinícius Cidral, da Comissão de Direito Sindical da OAB-PR, deixou claro: acesso à informação não é favor, é estrutura da democracia. “A batalha pela narrativa começa na forma como se comunica. Muitas vezes, o silêncio institucional é o que permite que outros falem por nós”.


Ele relembrou marcos históricos da resistência democrática, como a Declaração de Curitiba (1972), e denunciou o uso distorcido da Lei de Acesso à Informação nos últimos anos, em que pedidos legítimos passaram a ser negados ou classificados como sigilosos. “Restringir o trabalho da imprensa é atacar o direito do cidadão de entender quem governa. Sindicato e imprensa são guardiões da democracia. Um protege o contraditório, o outro, ilumina”, destaca.


Sindicatos como trincheiras narrativas


Agatha Branco, vice-presidenta do Sindicato dos Engenheiros do Estado do Paraná (Senge), compartilhou a atuação da entidade durante a privatização da Copel — um episódio emblemático de conflito entre narrativa oficial e realidade vivida por trabalhadores. “A mídia oficial não quer ouvir os sindicatos. Por isso criamos nosso próprio estúdio, com podcast e ações nas redes. Precisamos contar a nossa versão dos fatos”, considera.


Agatha destacou a importância de formar novas lideranças, com ações como mentorias, prêmios e projetos com estudantes universitários. O objetivo: reconstruir a legitimidade do sindicato e furar a bolha da desinformação, especialmente entre jovens profissionais que ainda resistem à ideia de sindicalização.


Dados também contam histórias — e nem sempre as certas


O economista Sandro Silva, supervisor técnico do (Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (DIEESE), trouxe um olhar analítico sobre o papel dos dados na disputa narrativa. Segundo ele, a falta de transparência nas empresas privadas, somada à fragilização sindical pós-reforma trabalhista, compromete até as negociações coletivas.


“A informação virou um ativo estratégico. Quem domina os dados, domina a narrativa. E isso impõe uma responsabilidade enorme ao jornalismo e às entidades que produzem informação pública”, registra. Sandro defendeu uma aproximação contínua entre jornalistas e pesquisadores, para que os indicadores econômicos sejam compreendidos, contextualizados e, acima de tudo, usados para emancipar, e não para manipular.


Paula Zarth: “Não basta contestar. É preciso narrar com autoridade”


Jornalista e mestra em Estudos de Linguagens, a ex-dirigente do SindijorPR e da FENAJ Paula Zarth foi direta: o jornalismo e os movimentos sociais vivem uma crise de credibilidade, não por falhas em seus princípios, mas por enfrentarem um ecossistema construído para desacreditá-los.


Ela relembrou os ataques à imprensa durante o governo Bolsonaro, o apagão de dados na pandemia e o surgimento do consórcio de veículos de imprensa como alternativa à omissão institucional. “O movimento sindical precisa recuperar sua voz pública. E isso só acontece se a gente conseguir se comunicar com clareza, sensibilidade e coragem editorial”, analisa a jornalista que, juntamente com Márcio Garoni, foi idealizadora do monitor de discursos públicos de Bolsonaro – iniciativa fundamental para a responsabilização jurídica do ex-presidente.


Para Paula, narrar com autoridade é conectar as pautas sindicais com a vida real, com as dores, esperanças e dilemas de quem está na base.


Cristiane Zacarias: onde tem mulher, tem mais democracia


A presidenta do Sindicato dos Bancários de Curitiba e Região, Cristiane Zacarias, trouxe à tona a questão do machismo estrutural ainda presente dentro dos próprios sindicatos. “O movimento sindical foi feito por homens e para homens. Mas onde a mulher chega, ela transforma. E onde tem mulher, tem mais democracia”, afirma.


Ela destacou ações concretas, como a criação de campeonatos de futsal feminino com estrutura de apoio e creche, e projetos de formação política com recorte de gênero - iniciativas que aproximam mulheres da luta sindical e, ao mesmo tempo, mostram que o cuidado e a escuta são potências políticas.


“As narrativas que vencem não são só técnicas, são as que fazem sentido para a vida real. Quando falamos de acesso à informação, falamos também de acesso à voz. E voz é poder”, expressa.


Juventude, inovação e disputa de futuro


Entre os destaques da mesa, o projeto Senge Jovem, promovido pelo Sindicato dos Engenheiros, foi citado como uma das experiências mais eficazes para renovar o engajamento sindical. Com mentorias, prêmios, podcast e eventos realizados em parceria com a Mútua e a Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR), o projeto aproxima estudantes das pautas políticas e trabalhistas, e combate o estigma de que o sindicato é algo do passado.


“A juventude não quer só assembleia. Quer ser ouvida, quer criar, quer espaço. A gente precisa abrir as portas, ou vai continuar falando sozinho”, provocou Agatha Branco.


Tensões e aprendizados: entre o direito e a disputa


Ao longo do debate, algumas convergências se tornaram inescapáveis:


-O acesso à informação deve ser garantido de forma ativa, não apenas reativa.


-Dados públicos e institucionais precisam de mediação jornalística qualificada.


-O movimento sindical deve investir em comunicação estratégica e narrativa emocionalmente conectada com a base.


-A presença das mulheres muda a estrutura e precisa ser fortalecida institucionalmente.


-O jornalismo é parte da luta democrática, não apenas seu observador.


Conclusão: narrar é resistir


Mais do que um painel técnico, a mesa “Jornalismo, acesso à informação e disputas de narrativas” foi uma reafirmação de princípios. Em tempos de verdades manipuladas e direitos ameaçados, narrar é resistir, e contar a própria história é uma forma de garantir que ela não seja contada por quem quer silenciar.


“Fortalecer o sindicato é fortalecer o acesso à informação. E fortalecer a informação é garantir democracia viva”, chancela o advogado Vinícius Cidral.


Realização


O 8º Congresso Paranaense de Jornalistas só se tornou possível graças à parceria e ao apoio inestimável de diversas entidades e empresas, que acreditam na força e na relevância do jornalismo paranaense: Bebidas Campo Largo, Copel, CUT Paraná, FETECPR, Mabu Hotéis, OAB PR, Sacod UFPR, Sanepar, Senge-PR, Sicredi, Sindicato dos Bancários de Curitiba, Sismuc, Suli Confeitaria, Teatro Guaíra e Tudo Menos Glúten.


Acesse aqui o vídeo da mesa Jornalismo, acesso à informação e disputas de narrativas


Confira mais fotos do 8º Congresso Paranaense de Jornalistas no Flickr do SindijorPR

Autor:SindijorPR
Gralha Confere TRE