Começa hoje, das 19h às 21h, no Centro de Eventos do Shopping Estação, a I Jornada Nacional Mulher Viver Sem Violência. O encontro acontecerá de 23 a 25 de novembro, na UP e na UFPR, com o objetivo de debater sobre as formas de violência de gênero e doméstica contra as mulheres, discorrer sobre suas causas e efeitos e refletir sobre propostas de intervenção e erradicação das desigualdades de gênero.
O evento também deseja compartilhar práticas de intervenção em que os resultados
tenham contribuído para a superação da discriminação e violência contra as
mulheres, e proporcionar condições para que as mulheres que superaram a
violência com apoio das políticas públicas possam manifestar-se por meio de
depoimentos e produções artísticas e literárias.
A programação completa do evento você pode acompanhar aqui.
Mariana Franco Ramos, diretora de fiscalização do SindijorPr
e integrante do Coletivo de Jornalistas Feministas Nísia Floresta, participa do
evento como painelista sobre o tema Interseção entre Mídia e Gênero. Na
entrevista abaixo, ela adianta um pouco das relações existentes entre esses dois
temas.
O que a mídia tem a ver com a cultura machista?
Sabemos que o machismo, quando não a misoginia (que é o ódio ou aversão a
mulheres), está impregnado na sociedade brasileira. E a mídia, evidentemente,
está inserida nesse contexto. São muitos os jornais que abordam, por exemplo,
situações de violência de forma sensacionalista ou culpabilizadora, reforçando
estereótipos e contribuindo para a manutenção do status quo. Mas acredito que
existe sim, de outro lado, um movimento contrário, de grupos de jornalistas
comprometidos em, ao relatar os problemas, apontar possíveis soluções. A
presença de mulheres, muitas das quais feministas, nas redações é fundamental
para confrontar a “lógica” midiática de invisibilidade, opressão e
objetificação.
Como as formas pelas quais a mídia aborda o gênero e a sexualidade ajudam na
construção do imaginário coletivo sobre esses temas?
Acredito que é preciso tratar os fatos de forma mais contextualizada,
contrapondo opiniões embasadas, de especialistas no assunto. Além da
culpabilização e do reforço de estereótipos, que eu já citei, muitos
profissionais insistem em não dar nomes às coisas – preferem, por exemplo,
falar em "crime passional", ao invés de feminicídio, que é o termo
correto para assassinato motivado por gênero, ou em sexo sem consentimento, que
nada mais é do que estupro.
As redações dos grandes jornais ainda são majoritariamente formadas por pessoas
brancas, héteros e cisgêneras. Que tipo de representatividade esse jornalismo
tem sobre a sociedade brasileira?
Uma pesquisa de 2012 da Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj) mostrou que
as mulheres são maioria nas redações, como são nos cursos de Comunicação
Social. No entanto, essa superioridade numérica não é verificada na composição
dos conselhos editoriais, por exemplo, responsáveis por definir aquilo que é
publicado/veiculado, nem tampouco nos times de articulistas. Faltam espaços
fixos, onde tenhamos voz e possamos pautar nossas experiências e vivências.
Outro ponto fundamental, como você colocou, é que apenas 23% dos profissionais
são negros e negras, ou seja, um percentual bem abaixo daquele apontado pelo
IBGE para se referir a pretos e pardos (conforme classificação do instituto).
E, embora eu não tenha dados específicos, sabemos que a representatividade de
transexuais na imprensa também é praticamente nula. Imagine então quantas
pessoas não se veem nos jornais, programas de rádio e de televisão. Ou que,
quando se veem, são retratadas de forma preconceituosa e desrespeitosa.
Precisamos, de uma vez por todas, de uma mídia que dê voz e vez a todos esses
públicos.
A mídia alternativa tem conseguido formular um discurso
diferenciado sobre a sexualidade e o gênero?
Existe um esforço de veículos alternativos, como Jornalistas Livres, Brasil de
Fato, Mídia Ninja e Geledés, além das blogueiras feministas e negras, em se pautar
esses assuntos. Acredito que o caminho passa por aí, bem como pelas iniciativas
de fortalecimento da mídia pública e de democratização dos meios. Mas, mesmo em
se tratando da imprensa não tradicional, é preciso sempre lutar por mais
representatividade.
Na esfera política, o debate de gênero não está avançando em
decorrência de questões religiosas e de conservadorismo da política, a mídia
também não está trazendo o debate como poderia. Como se pode avaliar isso e
fazer o debate com a sociedade? Neste cenário, qual é o papel das/os
jornalistas?
Os grupos conservadores, representados no Congresso Nacional
pela chamada bancada BBB (do Boi, da Bíblia e da Bala), conseguiram se
organizar. É uma aliança bastante poderosa, endossada agora pelo presidente da
Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ). Essa frente também possui seus veículos de
comunicação – a Folha Universal, por exemplo, que é um jornal semanal, tem uma
tiragem de 1,7 milhão de exemplares. Ou seja, consegue alcançar um público maior
inclusive do que veículos tradicionais. Os movimentos sociais precisam,
portanto, se unir também. Eu costumo dizer que tenho um lado, que é o dos
direitos humanos. E imagino que todos tenham – há nas redações, como em
qualquer espaço público ou privado, cristãos conservadores, empresários e
entusiastas das mais diversas pautas. Então por que não defendermos uma mídia
feminista, comprometida com a promoção da cidadania?
Qual a importância de um evento como a Jornada Nacional
Mulher - Viver sem violência?
Eventos como esse são importantes primeiro porque colocam o
tema em evidência e, segundo, porque reúnem especialistas das mais diversas
áreas, dispostos a debater em conjunto formas de prevenir e combater a
violência contra a mulher. Precisamos falar mais sobre assédio, sobre estupro,
sobre machismo e sobre gênero, seja na escola, dentro de casa ou em espaços
públicos.
A I Jornada Nacional Mulher Viver Sem Violência é uma
realização da Universidade Positivo (UP), em parceria com a Prefeitura
Municipal de Curitiba, Universidade Federal do Paraná (UFPR) e Núcleo de
Direitos Humanos da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUC-PR),