A segunda turma do Tribunal Regional do Trabalho 3ª Região Minas Gerais (TRT-MG) decidiu nesta terça-feira 20/10, por unanimidade, contra a ação do jornal Hoje em Dia, que há um ano tenta demitir por justa causa o jornalista Aloísio Morais Martins, diretor e ex-presidente do Sindicato. A decisão determina a reintegração do jornalista. O Sindicato considera a decisão uma vitória da liberdade de expressão e uma referência para a comunicação na internet e em redes sociais. Cabe recurso ao TST.
O tribunal
acompanhou o voto da relatora Maristela Íris da Silva Malheiros, que considerou
que Aloísio não cometeu falta grave ao compartilhar em rede social uma notícia
que o próprio jornal havia publicado. A decisão confirmou a sentença da juíza
Adriana Goulart de Sena Orsini, da 47ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte, que,
em maio deste ano, julgou o caso em primeira instância e também determinou a
reintegração do profissional aos quadros da empresa, “garantindo-lhe o
pagamento de sua remuneração mensal, acrescidas todas as vantagens contratuais
e legais”.
“Foi feita justiça”,
disse o advogado Luciano Marcos da Silva, que defende Aloísio na ação. Ele
lembrou que Aloísio tem reputação ilibada, é dirigente sindical e goza de bom
conceito dos colegas; trabalha no jornal há 28 anos, sem jamais ter sofrido
qualquer tipo de punição. “A publicação não é motivo suficiente para punição, e
ainda que fosse o jornal exacerbou ao tentar aplicar a pena máxima, que é a
demissão”, explicou.
Luciano Silva
acrescentou que o jornalista está sendo punido duplamente pela empresa, pois
foi afastado do trabalho e não está recebendo remuneração. Durante o julgamento
o advogado José Maria Caldeira fez a sustentação oral da defesa.
Liberdade
de pensamento e de expressão
Aloísio Morais foi
afastado do Hoje em dia no dia 31 de outubro de 2014. A Ação de Inquérito
Judicial foi ajuizada pela Edminas S.A., proprietária do jornal, sob a alegação
de que o jornalista teria publicado no Facebook, no dia 27/10/2014, três
manchetes do jornal “com dizeres que denegriam a imagem do seu empregador”. O
jornalista foi acusado ainda de ter usado “a mesma rede social para publicar
opiniões depreciando o jornal”. Em vista do que considerou “falta grave”
cometida pelo jornalista, a empresa fez uso da faculdade do art. 853 da CLT,
suspendendo-o e instaurando o referido inquérito, visando à rescisão do
contrato de trabalho por justa causa a partir da data do ajuizamento.
No dia 11 de
dezembro do ano passado foi realizada a primeira audiência entre as partes, que
acabou adiada para 11 de maio de 2015. Em sua defesa, Aloísio Morais sustentou
que não tem responsabilidade pela repercussão nacional do questionamento da
idoneidade da pesquisa de intenção de votos para presidente, em 2014, realizada
pelo Instituto Veritá. Reiterou que “não há como associar uma crítica
direcionada a certos institutos de pesquisa com a honra e a imagem da empresa
para a qual trabalha”. Conforme prova apresentada pela defesa nos autos,
Aloísio limitou-se a compartilhar e comentar publicação feita pelo sociólogo
Paulinho Saturnino no Facebook.
Na sentença da
primeira instância, a juíza Adriana Orsini cita prova existente nos autos de
que pesquisas realizadas pelo Instituto Veritá destoaram fortemente de outras
pesquisas realizadas por institutos consagrados e conhecidos dos leitores, como
Datafolha e Ibope. “Ao escolher como CAPA do jornal pesquisa destoante, assumiu
o risco de provocar reações variadas de seus leitores, inclusive seus próprios
empregados, como também que estas pessoas reagissem com perplexidade e fizessem
comentários nas redes sociais acerca das divergências observadas.”
A juíza lembrou que
o pluralismo político, bem como a liberdade de pensamento e de expressão são
direitos previstos na Constituição brasileira. “Neste sentido, a utilização de
rede social, ambiente notoriamente informal, para expressar críticas, seja a
partidos, candidatos ou à imprensa, é mera decorrência do exercício dos
direitos constitucionais e políticos de qualquer cidadão.” Ela salienta que o
comentário feito pelo jornalista no Facebook “foi breve e não foge à forma e ao
conteúdo de inúmeros outros comentários publicados nas redes sociais ou nos
próprios espaços disponibilizados pelos próprios jornais na internet, sendo
nitidamente informal e despretensioso, em conversa social com seus amigos do
Facebook”.
O caráter informal
e dinâmico das redes sociais possibilita aos participantes emitirem suas
opiniões com agilidade e rapidez. “Atribuir gravidade máxima justrabalhista à
expressão de pensamento, publicado em tal espaço de rede social, seria
desconsiderar a realidade deste novo meio de comunicação, que possui como
inequívoco diferencial o fato de ser um lugar informal e aberto à expressão de
opiniões”, afirma a sentença.
Prática
antissindical
A juíza considerou
ainda que o compartilhamento de foto com manchetes de três edições do jornal
Hoje em Dia não configura falta grave que justifique “a ruptura de um contrato
de trabalho de 27 anos de um empregado que é dirigente sindical”. Ela acrescenta
que foi o jornal “quem tomou a decisão de dar maior destaque aos institutos de
pesquisa que apresentavam determinado candidato liderando a disputa eleitoral
para presidente, o qual ao final saiu vencido”.
Justificando sua
decisão, a juíza cita a própria defesa da liberdade de imprensa feita pelo
jornal. “Seria razoável supor e defender que a liberdade de expressão seja não
apenas defendida, mas garantida aos seus próprios empregados com o mesmo
ardor”, observa. Mesmo durante a ditadura, lembra a juíza, os tribunais do
Trabalho não consideravam as convicções políticas e ideológicas do empregado
como justa causa de demissão.
“Com amparo no
texto constitucional, a jurisprudência trabalhista brasileira considerou nula a
despedida de empregado, porque verificada com autêntica restrição ao princípio
de liberdade de expressão, garantido no art. 5º, inciso IV da Constituição da
República de 1988, e determinou a reintegração do empregado”, diz a sentença.
A juíza relembra
que, segundo depoimento de colegas de trabalho, o jornalista goza de respeito e
consideração de todos e vê na ação do jornal uma prática antissindical. “Quando
o requerente se volta com virulência desproporcional ao ocorrido e em tratamento
incompatível, o tema da discriminação pela condição de um sindicalista,
defensor de estabilidade provisória que gera limite à fruição do poder
empregatício, não pode passar ao largo do caso dos autos, devendo ser
enfrentada”, afirma a sentença.